Um RPG de super-heróis. De novo. Como se não houvessem tentado antes. Como se não tivéssemos pilhas de sistemas tentando transformar heróis dos quadrinhos em algo jogável, sempre tropeçando entre estatísticas quebradas e combates mecânicos que nunca capturam a verdadeira experiência de ser sobre-humano. E no final, os jogadores sempre voltam para os mesmos sistemas consagrados, porque inovar em RPGs de super-heróis parece ser uma tarefa impossível.
Mas agora, o impossível está acontecendo.
Invincible – Superhero Roleplaying é o novo RPG da Free League Publishing, baseado nos quadrinhos de Robert Kirkman (The Walking Dead), Cory Walker e Ryan Ottley. Mas se engana quem pensa que este será só mais um jogo onde jogadores usam colantes coloridos e trocam socos sem consequências. Invincible nunca foi um quadrinho sobre “heróis” no sentido tradicional. Sempre foi sobre o preço do poder, sobre colapsos emocionais, traições, política intergaláctica e a inevitabilidade da destruição. Quem já leu os 144 volumes da saga sabe que esta história não é sobre vencer. É sobre sobreviver – e nem sempre isso acontece.
A Free League Publishing já provou sua habilidade em transformar IPs amadas em RPGs que capturam a alma de suas narrativas. Blade Runner RPG trouxe a desesperança neon-noir da franquia para as mesas de jogo. ALIEN RPG fez os jogadores sentirem na pele a fragilidade humana contra monstros imbatíveis. Agora, com Invincible, eles prometem redefinir o que um RPG de super-heróis pode ser – ou melhor, o que ele deveria ser.
Um Time de Criadores que Entende de Tragédias e Violência
Se você acha que Invincible nas mesas de jogo será apenas um passeio cheio de adrenalina e explosões cinematográficas, então precisa conhecer a equipe por trás do projeto. O jogo está sendo desenvolvido por Adam Bradford, fundador do D&D Beyond e designer envolvido em sistemas como Marvel Multiverse RPG e Cortex Prime. Ao lado dele, Tomas Härenstam, cofundador da Free League e designer-chefe de ALIEN RPG, Mutant: Year Zero e Dragonbane.
Mas a cereja do bolo, ou a bomba-relógio, se preferir, é a participação de Johan Nohr, o artista gráfico responsável pelo MÖRK BORG, o RPG que parece um manifesto anarquista ilustrado com o sangue dos jogadores.
Isso significa que o Invincible RPG pode ser tão brutal visualmente quanto mecanicamente. É impossível ignorar o impacto que o design de MÖRK BORG teve no mercado, e se Nohr resolver trazer um pouco desse caos gráfico para Invincible, os jogadores podem se preparar para um livro que será, no mínimo, uma experiência sensorial.
O jogo será baseado no Year Zero Engine, o mesmo sistema por trás de Blade Runner RPG, Mutant: Year Zero e ALIEN RPG. Um motor que equilibra narrativa e letalidade, onde os jogadores sempre têm escolhas – mas raramente têm boas opções.
144 Edições de História: Como Transformar Isso em RPG?
A principal diferença de Invincible para outros quadrinhos de super-heróis está no fato de que sua narrativa tem um começo, meio e fim. São 144 edições, sem reboots, sem retcons forçados, sem a bagunça cronológica dos quadrinhos tradicionais. Isso significa que Invincible tem uma progressão lógica, e seu RPG pode capturar essa ideia de forma única.
Adam Bradford deixou isso claro em um comunicado oficial:
“Invincible é minha série de quadrinhos favorita, e eu queria jogar nesse universo há anos. A forma como a história se desenrola como uma saga épica ao longo de 144 edições – sem retcons infinitos – faz com que ele se encaixe perfeitamente em um RPG de mesa. Mal posso esperar para os fãs criarem suas próprias histórias dentro deste universo.“
O desafio será estruturar o RPG para que ele possa replicar essa progressão. Será um sistema onde personagens evoluem ao longo de campanhas épicas, enfrentando mudanças de status, alianças e catástrofes? Ou algo mais episódico, onde cada sessão é um reflexo do caos dos quadrinhos?
Outro problema: Invincible é um universo onde alguns personagens são absurdamente mais fortes que outros. Como equilibrar isso sem desvalorizar aqueles que não são filhos de uma raça genocida de conquistadores intergalácticos?
Tomas Härenstam acredita que o Year Zero Engine pode ser a resposta:
“Meu primeiro RPG de super-heróis foi o Marvel Superheroes da TSR, e criar um RPG desse gênero sempre foi um sonho. Acho que o estilo visceral e mais ‘pé no chão’ de Invincible se encaixa bem na mecânica do Year Zero Engine.“
Mas será que um sistema originalmente criado para RPGs de horror e ficção científica pós-apocalíptica consegue lidar com o caos dos superpoderes?
O Problema Atom Eve: Como um Sistema de RPG Pode Lidar com Superpoderes sem Controle?
Se há uma grande incógnita neste projeto, ela se chama Atom Eve. Quem conhece os quadrinhos sabe que sua habilidade de manipular matéria torna qualquer sistema de RPG um inferno de balanceamento. Se ela pode transformar qualquer coisa em qualquer outra coisa, como equilibrar isso dentro de um jogo sem transformar o resto do elenco em coadjuvantes?
Existem três caminhos possíveis:
- Limitar os poderes – Reduzir a escala do que Atom Eve pode fazer, transformando-a em algo mais gerenciável. Mas isso mataria a essência do personagem.
- Criar um sistema de custos narrativos – Fazer com que usar poderes tenha riscos que podem afetar a história e os relacionamentos dos personagens.
- Deixar nas mãos do Mestre – O que basicamente significa que cada grupo terá que lidar com o problema sozinho.
Nenhuma dessas opções é perfeita, e qualquer escolha que a Free League fizer será alvo de debate.
Kickstarter: O Jogo vai Demorar?
O RPG será lançado via Kickstarter, o que sempre gera um misto de empolgação e cansaço. Há quem adore apoiar campanhas, mas também há quem não aguente mais esperar anos para receber um livro.
A Free League, no entanto, tem um histórico sólido. Nos últimos anos, arrecadaram mais de 12 milhões de dólares em 36 campanhas bem-sucedidas, incluindo The One Ring, Blade Runner RPG e Vaesen. Se há uma editora que pode entregar o que promete, é essa.
Mas ainda assim, o tempo de espera será um fator importante para os jogadores decidirem se vale a pena apoiar desde o início ou esperar até que o livro esteja disponível no varejo.
Um RPG que pode finalmente fazer Super-Heróis funcionarem?
A grande questão aqui não é apenas se Invincible será um bom RPG. A pergunta real é: será que este jogo pode finalmente quebrar a maldição dos RPGs de super-heróis?
Super-heróis sempre foram um gênero difícil de traduzir para RPG. Ou os sistemas são complexos demais, ou são tão simplificados que perdem a essência dos quadrinhos. A Free League pode ter encontrado uma solução ao focar mais no drama e na tensão narrativa do que em estatísticas mirabolantes.
Se funcionar, pode ser um divisor de águas.
Se fracassar, será mais um nome na longa lista de tentativas falhas.
Seja como for, o hype está garantido. E você? Está pronto para ser esmagado pela brutalidade deste jogo?