A indústria do RPG nunca foi sobre grandes corporações. Sempre foi sobre mesas improvisadas, regras flexíveis e a mágica que acontece entre jogadores. Wizards of the Coast tentou mudar isso. Tentou domar o caos criativo e embalar a experiência de Dungeons & Dragons dentro de um ambiente digital controlado. O resultado? Um fracasso.
O Sigil surgiu como uma grande promessa. Apresentado como o futuro digital de D&D, o projeto recebeu investimentos, teve meses de desenvolvimento e carregou consigo a ambição de monopolizar o espaço das ferramentas digitais de RPG. Mas o que aconteceu depois? Pouco mais de um mês após seu lançamento, a WotC demitiu 90% da equipe do Sigil, reduzindo o time a apenas três funcionários.
Many Sigil staff let go at WotC #sigil #vtt #dnd #dndbeyond
— darjr (@darjr.bsky.social) 18 de março de 2025 às 23:46
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Um corte brutal, mas previsível. Para muitos, o Sigil já nasceu condenado, não por sua tecnologia, mas pela forma como foi concebido e empurrado ao mercado sem qualquer compreensão real do que os jogadores querem.
O Espectro da Obsessão Corporativa
Sigil era para ser um grande salto. No papel, prometia integração total com o D&D Beyond, gráficos sofisticados e uma experiência digital imersiva. Teve vídeos f0d1d0s sobre a revolução. Mas quando finalmente foi lançado, ninguém percebeu.
Sem anúncios chamativos, sem uma beta realmente significativa, sem engajamento da comunidade. O Sigil surgiu e afundou no mesmo silêncio com que foi apresentado. A falta de impacto pode ter sido o golpe final: se um produto digital não gera engajamento, ele não sobrevive.
Jogadores, acostumados a plataformas como Roll20 e Foundry VTT sequer cogitaram migrar. Porque o Sigil não trouxe nada de revolucionário. Não solucionou problemas. Não inovou. Apenas tentou lucrar em cima de um mercado já consolidado.
A WotC ignorou completamente a essência do RPG. Esqueceu que D&D não é um serviço de assinatura, não é uma engine para um MMO, não é uma experiência visual sobre gráficos 3D. D&D é um jogo sobre contar histórias, sobre improviso, sobre interação. O fracasso do Sigil não aconteceu por falta de tecnologia. Aconteceu porque não há como transformar criatividade em microtransação.
Hasbro e o Ciclo da Ganância
As demissões da equipe do Sigil não são um caso isolado. São apenas mais um reflexo de um padrão corporativo da Hasbro, controladora da Wizards of the Coast.
O que acontece quando um grande conglomerado falha em transformar um hobby em um modelo de negócios escalável? Ele não revisa suas estratégias, não reavalia sua abordagem, não tenta entender os erros. Ele simplesmente corta custos.
Sigil foi uma tentativa de monopolizar o espaço digital do RPG, assim como a Wizards tentou com a polêmica da OGL. Quando viram que isso não daria o retorno esperado, optaram pelo caminho mais curto: desmontaram o time e seguiram em frente.
A verdade é que, como diria meu amigo Xavier, a Hasbro nunca entendeu Dungeons & Dragons. Eles sabem que a marca vende, mas não sabem o que ela significa. Sabem que há milhões de jogadores, mas não compreendem por que jogam. E esse ciclo se repete.
Foi assim com a OGL. Foi assim com a tentativa de um D&D digital nos tempos da 4ª edição (e ainda vou fazer um texto sobre). Foi assim com o abandono de diversas ferramentas e promessas que nunca vingaram.
E, no final, a única coisa que realmente morre é a credibilidade – se é que existe alguma ainda.
O Que Fica, O Que Morre e O Que Já Apodreceu
A WotC continuará existindo. Porque D&D ainda é a maior marca de RPG do mundo. Mas o que Sigil provou é que a empresa já não tem o respeito da sua própria comunidade.
O corte na equipe do VTT não foi um erro de cálculo, foi um reflexo de prioridades erradas. Entre minhas anotações que faço, o padrão está claro:
- A Wizards lança algo novo.
- Tenta forçar o público a adotá-lo.
- Falha miseravelmente.
- Abandona o projeto e corta custos.
- Volta a lucrar com os produtos tradicionais e repete o ciclo.
Os jogadores continuarão jogando Dungeons & Dragons, mas não porque confiam na Wizards. Eles jogam apesar dela. Porque D&D não pertence à Hasbro. Nunca pertenceu.
A pergunta nunca foi “por que Sigil fracassou?”.
A pergunta é: alguém realmente achou que daria certo?
Pra quem quiser se aprofundar, o ARDDHU fez um vídeo sobre que explica o contexto com mais profundidade: